REGISTROS, GENEALOGIAS, HISTÓRIAS E POESIAS...
a fim de preservação da memória de nossos ancestrais
MARILIA GUDOLLE C. GÖTTENS

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Na voz rouquenha do Taimbé...

                                                 Ao Deuclides Pereira Gudolle (Dico)




Clareou o dia na estância e apontou na madrugada,
um caponete que a estrada, atrás da curva escondia...
Do caponete nascia... água fresca, borbulhante,
que engrossava mais adiante e encaixoeirada corria...
A correnteza chegando, pela chapada espraiava; 
mas logo em frente esbarrava, no mural que lá se erguia...
Correndo, a água subia e descia em cascata,
arqueada sobre a sapata, da rampa da penedia,
bem onde a pedra se abria, numa rocha alcantilada...
Uma bacia escavada, num lago azul recebia a água que ali caía entre bolhas espumantes,
tingida pelos cambiantes, de luz que o sol espargia...
Na superfície do lago e sobre pedras esparsas, miravam-se brancas garças, enquanto a água sumia, e enquanto dela se ouvia...mato à dentro, penetrando, 
roucas vozes murmurando, nos ecos da serrania...

                                                                  
                                                                   Fábio Silva Conceição

sexta-feira, 29 de julho de 2016

O Diário Antigo

Relendo o Diário Antigo que guardo a cópia escondido, outrora de meu Bisavô;
nele estão os registros, de alegrias e tristezas, que a vida lhe reservou...
Conta a estória de seu pai, que muito jovem ainda, deixou sua pátria linda
para aqui no Rio Grande aportar...
Cruzou mares, tempestades, mas mesmo naquela idade tinha em sua intuição, 
que era nesses rincões, que iria morar...
Dali algum tempo encontrou, a filha do suzerano que viera fugido de Espanha, escondido em um barril;
E este também achou, após galopadas mil, a sua missioneira faceira que deus à luz a menina,
que um dia o francês se casou...
Diziam nos tempos de antanho, que o espanhol era guapo, mas que aqui chegou só em trapos,
fugido dos Carlistas, com aquelas roupas com listas, que mais parecia um palhaço...e a sua missioneira, com sua beleza brejeira, logo lhe conquistou...
Diz que ela também ia, nua, na sanga fria, banhar seu corpo ao luar... entonces o suzerano pulava, e bem alto gritava: "así tú vás ahogar"...
Mas voltando ao francês, com quem a menina casou; cruzou matas, cercanias, noites de chuvas frias, até que um lugar encontrou...
Era a fronteira abençoada, que ali com a sua amada, foi fazer sua morada, para de lá, não sair mais...
Assim, também o rapaz, virou mascate e seguiu, cruzando estradas e rios com sua carreta enfeitada; levando um pouco de cada: chapéus, fitas, tecidos e vidros bem coloridos de água-de-cheiro escondidos, para as moças comprar...
Duas filhas então nasceram daquele jovem casal; mas a cruel fatalidade, sem dó, e sem piedade, logo as duas levaram ficando solito os pais...
Algum tempo depois, veio então meu bisavô, que bem cedo ficou órfão do pai, que solito, indo cobrar um maldito, ao lar não mais retornou; caindo ao chão estendido, com a discussão que travou...
Ficaram então, mãe e filho, naqueles fundão lá de fora, onde a brisa não demora, em carregar a ilusão...
Foram indo, de mansinho, levando a vida sozinhos; até adquirir a estância, que nunca me sai da lembrança, que a chamou "Bela União".

                                                                          Marilia Gudolle Gottens
                                                                                      Jan/2015

domingo, 17 de julho de 2016

Promessa

                                                 Ao Primo Fábio Silva Conceição


Quando criança ouvia, histórias e correrias, lá dos pagos do Itaqui; das longínquas campereadas, das grandes gineteadas e sobre as cristalinas águas, do imenso Ibicuí...
Na minha mente eu pintava um céu de estrelas e eu dava as cores das madrugadas, onde solita andava enquanto a lua banhava, com claridade o chão...
Trago comigo a saudade, de campos, matos, estâncias, mas que na minha infância, sempre gravado ficou...
Trago bailes de querências, amores com eloquência em que a mim desenhou...
Embora eu, poucas vezes, tenha andado por aí, me parece que então vivi anos nesse rincão que foi de meus ancestrais e toda a parentela, que agora não voltam mais...
Quem sabe, primo Fábio um dia, eu apareça no Bororé; não sei se à cavalo, ou à pé, mas de uma coisa acredite, por mais que eu não lhe visite, fica a promessa em pé.

                                                                                Marilia Gudolle Gottens
                                                                                            Dez./2015

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Revolução Farrapa - Toque de silêncio

          É hora de soprar as velas. Acender a luz elétrica. Escutar o telefone, as buzinas estridentes. O matraquear de um edifício em construção. É hora de voltar ao ritmo da vida moderna.
          Um mergulho no passado nos devolve estonteados. Meus ouvidos se habituaram com o canto dos pássaros. meus olhos ainda estão cheios de vaga-lumes. De horizontes a perder de vista. Anseio pelo gosto da pitanga. Acostumei-me ao ar perfumado de outro século.
          Passeio pelo apartamento em busca de algo do passado. Qualquer traço de união com o mundo em que vivi. Sorrio ao lembrar-me de um sobrevivente do Rio Grande antigo. Aqueço água no fogão a gás e ponho erva na cuia. O gosto do chimarrão é o mesmo de todos os tempos. Herança nativa que teima em sobreviver.
          Tomando mate me aproximo da janela. O dia já está claro. Automóveis vão tomando conta da rua. Entre os edifícios, ainda vejo uns retalhos do Guaíba. Sereno e cor de café com leite. Por sobre o telhado do Teatro São Pedro, descanso a vista na Praça da Matriz. Todos os jacarandás estão floridos. Os balanços ainda estão vazios. Pessoas caminham apressadas. Ninguém se cumprimenta. Ninguém tem tempo a perder.
          Antes de ser arrastado pela correnteza, procuro os traços que a revolução deixou. Do outro lado da praça, no lugar do antigo casarão de onde fugiu Fernandes Braga, ergue-se um palácio de estilo neoclássico. Ainda trabalha e dorme ali o presidente da província. Mas o palácio se chama Piratini. A Rua da Igreja é agora Duque de Caxias. O poder legislativo se abriga no Palácio Farroupilha. A bandeira da República Rio-Grandense ondula ao lado da bandeira do Brasil.
          Tiro o carro da garagem e saio à procura de outra praça. Tenho a cabeça povoada de fantasmas. Dirijo devagar. Estaciono o carro e saio a caminhar entre as paineiras. Parecem árvores de Natal enfeitadas de algodão. A praça está deserta. Um leque de palmeiras imperiais contorna a estátua branca. Garibaldi e Anita ali estão a minha frente. É bom vê-los juntos outra vez.
          Garibaldi nunca esqueceu o Rio Grande. Da Itália, respondendo a uma carta de Domingos José de Almeida, assim recorda seus companheiros de revolução:

 "Quando penso no Rio Grande, nessa bela e cara província, quando penso no carinho                                      como fui recebido por vossas famílias, onde fui considerado como filho. Quando penso                        em vossos valorosos concidadãos e nos sublimes exemplos de amor pátrio e abnegação                        que deles recebi, fico realmente comovido. E o passado de minha vida se projeta na                              memória como alguma coisa de sobrenatural, de mágico, de verdadeiramente     romântico.
          Vi quantidades de tropas mais numerosas, batalhas mais renhidas, mas nunca vi, em nenhuma        parte, homens mais valentes nem cavaleiros mais brilhantes do que os da cavalaria rio-            grandense, em cujas fileiras comecei a desprezar o perigo e combater dignamente pela causa das nações. Quantas vezes fui tentado a revelar ao mundo os feitos assombrosos que vi realizar por essa gente viril que sustentou por mais de nove anos a mais encarniçada luta contra um poderoso Império!..


          Um joão-de-barro está fazendo ninho no peito de Garibaldi. Mas as pessoas que passam não vêem esse poema de amor. É preciso seguir em frente. tenho ainda uma promessa a cumprir.
          Atravesso as pontes do Guaíba. Vou em busca da casa de Gomes Jardim. Dali partiram os primeiros combatentes de 1835. E ali se apagou a última chama da revolução.
          Assinada a paz de Ponche Verde, cada um seguiu o seu caminho. Gomes Jardim e Isabel Leonor retornaram às Pedras Brancas. A estância que deu origem à cidade de Guaíba fora pilhada pelas tropas imperiais. Nenhum gado sobrara nas pastagens. Silêncio na olaria e na charqueada. Mas no alto da coxilha que domina o rio, a casa resistira ao abandono. E o cipreste continuava a balançar seus galhos ao vento sul.
          O casal está velho. E é preciso começar tudo de novo. Trabalham lado a lado como nos primeiros tempos. Os campos vão sendo repovoados. Peões antigos voltam ao galpão campeiro. Vacas vão dando cria. A semente brota na terra. A casa tem outra vez o cheiro de pão. 
          Estaciono o carro diante da casa de Gomes Jardim. Um século e meio depois do início da guerra, ela ainda está no mesmo lugar. A cidade cresceu a sua volta. Mas o cipreste ainda lhe guarda a porta. E a vista se perde na imensidão do rio.
          Começo a sentir o pulso acelerado. Desço do carro e me dirijo à casa. O tempo vai recuando a cada passo. Ainda me falta assistir ao derradeiro ato. Antes do pano cair.
          Faz frio no alto da cochilha. É o dia 18 de julho de 1847. Pouco mais de dois anos depois da paz. Está aberta a porta da sala de visitas. Muitas pessoas aguardam em silêncio. Em cada rosto uma expressão de dor. Passo por elas e me dirijo ao quarto. Cheiro forte de cânfora e de álcool. Apoiado contra os travesseiros, Bento Gonçalves acaba de morrer.
          No mesmo barco que o trouxe de Triunfo, seu corpo é levado até Camaquã. O enterro é simples. Poucos amigos estão na Estância do Cristal. Mas um deles guardará seu túmulo. Nico Ribeiro, o ex-escravo e corneteiro. E os gaúchos, passando pela estrada, ouvirão muitas vezes o clarim. É o toque de silêncio de uma guerra. Que até hoje não chegou ao fim. 



Cheuiche, Alcy, A Guerra dos Farrapos, Porto Alegre, 1984       

quarta-feira, 23 de julho de 2014

A Lua - Deuclydes P. Gudolle


Serás, ó lua, a eterna companheira
Do gaúcho que cruza descuidado
Sob a tua luz tão feiticeira
Nas noites do rincão, sempre lembrado...

E daqui, contemplando desolado
Revejo-me na lida verdadeira
Quando eu era um gaúcho afortunado
E levava uma vida alvissareira...

E ao ver-te agora, pálida e triste
Eu penso que por lá não mais existe
Aquelas lindas noites de luar...

Quando feliz voltava ao rancho amado
Ao calor de tua luz iluminado
Meu cavalo ia então desencilhar...


DELLE - P.Fundo, Out.1952



Arquivo Pessoal de Marilia Gudolle Gottens


Minha Lira - Deuclydes P. Gudolle


Eu quisera quebrar a minha lira
E fazê-la para sempre emudecer
Para que nenhum só som a fira
E que possa um queixume parecer...

Mas não posso, hei de sempre enaltecer
Esta dor que canta e que delira
E que na exaltação desse sofrer
A dor trará o bem que a alma inspira...

O poeta será sempre um sofredor
Que veio ao mundo imerso em desventuras
E para cantar sua própria dor...

E essa dor, sendo sua é verdadeira
E será neste mundo de tortura
A mais fiel e unida companheira...

DELLE - Santa Thereza   Out.1941


Arquivo Pessoal de Marilia Gudolle Göttens

terça-feira, 22 de julho de 2014

João da Silva Machado - (Barão de Antonina)

OBS:  Esta postagem encontra-se incompleta no referente a descendência do Barão de Antonina. Aos que desejarem complementá-la, sintam-se à vontade enviando-me os dados.


" A 24 de junho de 1782 o Vigário Manoel Garcia Mascarenhas batizava a João da Silva Machado, que mais tarde foi agraciado com o título de Barão de Antonina, nascido a 17 daquele mês e ano. Era filho legítimo do açoriano Manoel da Silva Jorge, natural e batizado na Freguesia de Santa Catarina da Ilha Fayal, Bispado de Angra, e de Antônia Maria de Bittencourt, nascida na Freguesia de Santo Ângelo do Rio Pardo (Rs), então pertencente ao Bispado do Rio de Janeiro. Era neto paterno de Inácio da Silveira, natural da Ilha São Jorge, e de  Ana Silveira, natural da dita Freguesia da Ilha Fayal; e materno do alferes Matias da Silveira, natural da Ilha São Jorge, e de Isabel Bittencourt, do mesmo Bispado de Angra; foram padrinhos Francisco Gomes Ferreira e sua mulher Francisca Inácio Gomes Ferreira (Liv.Iº de Bat.)."

     De simples tropeiro que comprava tropas no Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina e revendia-as nas feiras de Sorocaba, em São Paulo, na província de Minas gerais, Feira de Santana, na Bahia e chegou a levar animais até Caxias, no Maranhão, tornou-se segundo seu biógrafo, um elemento de progresso de São Paulo, Paraná, Santa catarina e Rio Grande do Sul. Por seu perseverante trabalho e valor, alcançou uma brilhante posição.
     Quando irrompeu a Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul, o Barão tomou parte ativa na defesa da legalidade e recebeu honras de Coronel Honorário do Exército. Reprimiu a revolução Liberal, que iniciou em São Paulo, em 1842, e se alastrava para o Paraná. Por isso, em 11 de setembro de 1843, recebeu o Título de Barão de Antonina, elevado a Barão com Grandeza pelo Decreto Imperial de 13 de agosto de 1860. Em 1853, atingiu o ponto culminante de sua carreira política, separando a Comarca de Curitiba e formando uma nova Província, a do Paraná, pela qual qual se elegeu Senador. Continuou residindo em São Paulo e atuando politicamente pelo Paraná. Fundou vários aldeamentos indígenas e núcleos coloniais (entre eles destaca-se Rio Negro e Mafra) no sul do Brasil. Foi Diretor da Fábrica de Ferro de Ipanema.
     Por relevantes serviços, foi designado com o Título de Vereador Honorário de Sua Majestade a Imperatriz, Grande do Império, Fidalgo Cavaleiro da casa Imperial, Grande Dignatário da Ordem da Rosa e Oficial da Ordem do Cruzeiro. Por tudo isso, associações culturais proclamaram sua capacidade. O instituto Histórico e Geográfico Brasileiro o recebeu como sócio.
     Na página 48 do Arquivo Nobiliárquico Brasileiro e na página 30 do Nobiliário Sul Rio-grandense está estampado o Escudo que descreve o Brasão e suas Armas: em campo de prata, um leão de púrpura armado de goles, tendo, na garra deste um catecismo e um rosário de ouro e na espádua um machado do mesmo metal; acompanhado à sinistra de um índio ao natural, virado para a esquerda, depondo as armas, que são de ouro. O Brasão foi passado em 17 de setembro de 1850. Registrado no Cartório da Nobreza, Livro VI, fl.40.

     O Barão foi casado com Ana Ubaldina Paraíso Guimarães, natural do Paraná, filha de Manoel Gonçalves Guimarães e Maria Madalena de Lima, de cujo casamento tiveram os seguintes filhos:

1. Maria Antonina, n. em Castro a 05/07/1815, que casou com o Coronel Mariano José da Cunha Ramos;

2. Francisca de Paula, n. na Vila do Príncipe, hoje Lapa, PR, que casou em São Paulo aos 19/04/1835 com o Capitão Joaquim da Silva Prado;

3. Balbina Alexandrina, n. na Vila do Príncipe, hoje Lapa, PR que casou em 14/04/1835, no Oratório Particular da Freguesia de Santa Efigênia, em São Paulo, com Luis Pereira de Campos Vergueiro, filho do Dr. Nicolau Pereira de Campos Vergueiro e de Maria Angélica de Vasconcelos.  Tiveram 13 filhos: Luísa, Balbina, João, Afonso, Francisca, Nicolau, Luiz Gonzaga, Joana, José, Ana, Maria Angélica, Otília e Artur.

4. Ana, n. em 26/08/1829, que casou com Fidelis Nepomuceno Prates;

5. Inocência Júlia, que casou com Fidêncio Nepomuceno Prates, irmão de Fidélis, natural de Caçapava, (Rs).



Arquivo Pessoal de Marilia Castro Gottens
Balem, Dr. João Maria  A Paróquia de São José de Taquari, Nov.1949, pg. 141, 
Serviço do Arquivo Histórico do Senado Federal Brasília - DF
Ecker, Adari Francisco  A Trilha dos Pioneiros Gráf. e Edit. Berthier - 2007